Política

Câmara aprova o “PL da dosemetria”, que reduz penas de Bolsonaro e condenados por tentativa de golpe

Foto: Sergio Lima/AFP

Na madrugada desta quarta-feira (10), a Câmara dos Deputados, aprovou na madrugada desta quarta-feira (10), às 2h26, o texto-base do projeto de lei que reduz as penas dos condenados por atos golpistas, incluindo o ataque de 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram e quebraram as sedes dos três Poderes, em Brasília.

Bolsonaro pode ser beneficiado pela medida. Ele foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão, acusado de comandar um plano para dar um golpe de Estado, e cumpre pena na sede da Polícia Federal (PF) em Brasília.

Se for aprovado, Bolsonaro pode ter a pena reduzida e passar menos tempo na cadeia. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda pode vetar a proposta integralmente ou em parte.

A decisão de colocar o tema em votação foi anunciada na manhã de terça (9) pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e surpreendeu os líderes partidários.

O tema da anistia e da redução das penas havia perdido impulso nos últimos meses. Em agosto, akliados de Bolsonaro ocuparam os plenários da Câmara e do Senado para tentar forçar a votação, sem sucesso.

Na manhã de terça, Motta anunciou que o tema entraria na pauta do dia, que também foi marcado por um tumulto envolvendo o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ).

À tarde, Braga tomou a cadeira de Motta e se recusou a sair, em protesto contra sua possível cassação por quebra de decoro parlamentar. Ele foi arrancado à força do Congresso. Durante o tumulto, a segurança da Câmara retirou a imprensa do plenário e cortou o sinal da TV que transmitia a sessão, em uma decisão inédita.

O chamado “PL da Dosimetria” será enviado ao Senado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), disse que ele deve ser votado até o fim do ano.

Aliados de Bolsonaro pedem anistia

Bolsonaro e seus aliados defendiam a anistia, mas a proposta aprovada na Câmara não trata da anulação das condenações, e sim da redução das penas.

“Não estamos dando anistia. Não tem anistia. As pessoas vão continuar pagando”, disse o relator do texto, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP).

O relator afirmou também que a lei desincentiva novos atentados contra a democracia. “Vão pensar duas vezes [antes de fazer novamente]”, disse.

Os parlamentares aliados de Lula consideram que o texto traz impunidade após as condenações definidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos últimos meses.

Segundo cálculos da equipe de Paulinho da Força, caso o projeto vire lei, Bolsonaro permaneceria preso em regime fechado por cerca de 2 anos e 4 meses.

O ex-presidente foi condenado pela Primeira Turma do STF em setembro. No dia 25 de novembro, o ministro Alexandre de Moraes decretou o trânsito em julgado (fim dos recursos) e determinou o início do cumprimento da pena. Quinze dias depois, a Câmara abre caminho para que a pena seja reduzida.

Bolsonaro está preso na sede da PF em Brasília desde 22 de novembro, após tentar violar a tornozereira eletrônica que usava na prisão domiciliar com um ferro de solda. Moraes considerou que ele tentava fugir e, naquele momento, decretou a prisão preventiva.

Deputado Paulinho da Força, relator do projeto – Foto: Câmara dos Deputados

Como a pena deve ser reduzida?

O projeto de lei estabelece que o crime de golpe de Estado, que tem pena maior, deve absorver o crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Com isso, a pena total de Bolsonaro já sofreria uma redução de 6 anos e 6 meses, por exemplo.

O texto prevê também progressão de regime mais rápida do que a atual, permitindo a saída do regime fechado após cumprimento de um sexto da pena. A regra vigente exige um quarto da pena.

Paulinho propõe ainda que os condenados que passaram um período com tornozeleira eletrônica em prisão domiciliar possam abater parte da pena contando dias trabalhados.

A cada três dias trabalhados fazendo uso da tornozeleira, um seria retirado da pena, segundo o relator.

O deputado disse que o texto foi construído em diálogo com lideranças partidárias e integrantes do STF.

“Se alguém recorrer ao Supremo dessa decisão, acho que vai perder”, declarou.

Ele admitiu que já havia mostrado, na semana passada, a proposta ao senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), mas disse não saber se o ex-presidente foi informado.

Na última sexta-feira (5), Flávio anunciou que será candidato à Presidência em 2026 com apoio do pai, o que desagradou líderes do Centrão.

Dois dias depois, no domingo (7), afirmou que poderia recuar, mas que isso teria um “preço”.

O texto aprovado na madrugada desta quarta-feira (10) é um substitutivo do relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), ao Projeto de Lei 2162/23, do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) e outros.

O substitutivo determina que os crimes de tentativa de acabar com o Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado, quando praticados no mesmo contexto, implicarão o uso da pena mais grave em vez da soma de ambas as penas.

O texto original previa anistia a todos os envolvidos nos atos de 8 de janeiro e dos acusados dos quatro grupos relacionados à tentativa de golpe de Estado julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Mas esse artigo foi retirado do projeto.

Grupo principal

Se virar lei, a nova forma de soma de penas deve beneficiar todos os condenados da tentativa de golpe de Estado, como aqueles do grupo principal:

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
  • Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil;
  • Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI);
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; e
  • Alexandre Ramagem, deputado federal.

Esse grupo foi condenado a penas que variam de 16 anos a 24 anos em regime fechado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), em caráter definitivo, em 25 de novembro deste ano. Outras penas de detenção devem ser cumpridas depois daquelas de reclusão.

Como a lei pode retroagir para beneficiar o réu, a nova regra implicaria a revisão do total para esses dois crimes, prevalecendo a pena maior (4 a 12 anos) por tentativa de golpe de Estado. Agravantes e atenuantes ainda serão aplicáveis sobre o cálculo.

Parlamentares da oposição preveem, para o ex-presidente Jair Bolsonaro, que o total da redução pode levar ao cumprimento de 2 anos e 4 meses em regime fechado em vez dos 7 anos e 8 meses pelo cálculo atual da vara de execução penal.

A conta final, no entanto, cabe ao Supremo definir e pode depender de ser validado o uso de trabalho e estudo em regime domiciliar para diminuição dos dias de prisão.

Progressão

A diferença também é influenciada pela mudança nas regras de progressão de regime fechado para semiaberto feita pelo relator.

Atualmente, exceto para condenados por crimes hediondos, o réu primário obtém progressão de pena se cumprir 16% dela em regime fechado, mas o crime não pode ter sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça.

Como os crimes de tentativa de golpe e abolição do Estado Democrático são tipificados com a característica de “violência ou grave ameaça”, Paulinho da Força muda o texto da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) para fazer valer os 16% de regime fechado para crimes com ou sem violência ou grave ameaça.

Sem a mudança, a progressão ocorreria apenas com o cumprimento de 25% da pena pelo réu primário. Para os reincidentes, o índice de cumprimento no regime fechado passa de 30% para 20%.

Esses 25% valerão apenas para o réu primário condenado por crimes contra a vida (título I do Código Penal) e contra o patrimônio (título II do Código Penal) praticados com violência ou grave ameaça.

Já a reincidência, na mesma situação de crimes contra a vida ou o patrimônio, continua implicando o cumprimento de 30% da pena para a progressão.

Outros crimes

A referência, no Código Penal, a crimes praticados com “grave ameaça” envolve vários não pertencentes aos títulos I e II, como o de afastamento de licitante (reclusão de 3 a 5 anos), constante do título XI.

Já no título VI estão tipificados crimes contra a liberdade sexual para os quais há agravantes relacionados a essa grave ameaça, como favorecimento da prostituição (reclusão de 4 a 10 anos) e rufianismo (reclusão de 2 a 8 anos), cujas progressões seriam também afetadas pela redação proposta, já que a referência à violência contra a pessoa ou grave ameaça, para efeitos de progressão de regime, é substituída pela referência apenas aos títulos I (crimes contra a vida, como homicídio) e II (crimes contra o patrimônio, como roubo).

Assim, esses crimes citados contarão com menor tempo para progressão de regime, pois não são enquadrados como hediondos, com exigência maior para alcançar o semiaberto, nem constam dos títulos I ou II do Código Penal.

Prisão domiciliar

O relator propõe ainda que a realização de estudo ou trabalho para reduzir a pena, como permitido atualmente no regime fechado, possa valer no caso da prisão em regime domiciliar.

Sobre esse tema, principalmente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) produziu jurisprudência permitindo essa prática, contanto que comprovada e fiscalizável.

Multidão

Para os crimes de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito e de tentativa de golpe de Estado, quando praticados em contexto de multidão, como o caso dos participantes dos atos de 8 de janeiro de 2023 nas sedes dos três Poderes, em Brasília, o texto reduz a pena de 1/3 a 2/3, desde que o agente não tenha financiado o ato ou exercido papel de liderança.

Destaques foram rejeitados

Fonte: Agência Câmara de Notícias/g1

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