Dono da Ultrafarma foi preso, em operação envolvendo auditores fiscais da Secretaria da Fazenda de SP

Foto: Reprodução/TV Globo
O dono e fundador da Ultrafarma, Sidney Oliveira, foi preso temporariamente na manhã desta terça-feira (12) em uma operação do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) para desarticular um esquema de corrupção envolvendo auditores fiscais tributários da Secretaria de Estado da Fazenda.
Além dele, outras cinco pessoas também foram presas: Artur Gomes da Silva Neto, Marcelo de Almeida Gouveia, Mario Otávio Gomes, Celso Éder Gonzaga de Araújo, Tatiane da Conceição Lopes.
Como funcionava o esquema
Segundo a investigação, chamada Operação Ícaro, Artur é auditor fiscal estadual de alto escalão e era o “cérebro” de um esquema de fraudes em créditos tributários que teria arrecadado cerca de R$ 1 bilhão em propinas desde 2021.
Crédito tributário é quando um contribuinte tem direito a ser ressarcido pelo Estado por um valor pago a mais à Receita. No entanto, o processo é complexo, e as empresas enfrentam burocracia e fila para conseguir de volta.
O auditor coletava a documentação necessária da Fast Shop e da Ultrafarma para pedir o ressarcimento de créditos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) junto à Secretaria da Fazenda.
Toda empresa contribuinte varejista tem direito ao ressarcimento, porém o procedimento é complexo, segundo os promotores, por isso Artur facilitava esse processo por meio de propinas.
Além de acompanhar o processo, o próprio auditor aprovava os pedidos e assegurava que não seriam revisados internamente, segundo o MP. Em alguns casos, liberavam valores superiores aos que as empresas tinham direito e em prazos mais curtos.
Em nota, a Secretaria de Estado da Fazenda informou que acabou “de instaurar processo administrativo para apurar, com rigor, a conduta do servidor envolvido” e que solicitou formalmente ao MP compartilhamento das informações
Como o esquema foi descoberto
De acordo com o MP, o que chamou a atenção e deu início à investigação foi a evolução patrimonial “absolutamente incompatível” da empresa em nome da mãe do fiscal preso, chamada Smart Tax.
A sede da empresa fica em um endereço na cidade de Ribeirão Pires, na Grande São Paulo, e, segundo o MP, é uma empresa fantasma e não tem nenhuma capacidade de prestar serviço de assessoria tributária.
“Até o meio de 2021, essa empresa não tinha atividade operacional, não tinha cliente, absolutamente nada. No segundo semestre de 2021, passa a receber da Fast Shop”, afirmou Ricupero.
“Conseguimos detectar e comprovar que houve o pagamento de valores ilícitos para funcionários públicos que por sua vez facilitaram a obtenção de favores fiscais para essas empresas”, afirmou o promotor Justiça Roberto Bodini.
Agora, o MP pretende ouvir funcionários das empresas para saber se apenas cumpriam ordens ou se tinham poder decisório sobre o esquema de corrupção.
Segundo o Ministério Público, a operação é fruto de meses de trabalho investigativo, com análise de documentos, quebras de sigilo e interceptações autorizadas pela Justiça.
Quem são os alvos
Seis pessoas foram presas nesta terça. Veja abaixo o papel de cada um dos investigados, segundo o MP-SP. Todos eles também foram alvos de mandados de busca e apreensão em imóveis:
- Aparecido ‘Sidney Oliveira’ – dono e fundador da Ultrafarma;
- Marcelo de Almeida Gouveia – auditor fiscal;
- Mário Otávio Gomes – diretor estatutário da Fast Shop;
- Artur Gomes da Silva Neto – auditor fiscal;
- Celso Éder Gonzaga de Araújo – dono casa onde as esmeraldas foram apreendidas;
- Tatiane da Conceição Lopes – esposa de Celso, dono da casa em que as esmeraldas foram apreendidas.
Sidney Oliveira foi preso em casa, uma chácara em Santa Isabel, na Grande São Paulo. Em nota, o advogado Fernando Capez, que defende o empresário, disse que celebrou há alguns meses um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) com o Ministério Público de SP, em que seu cliente reconheceu irregularidades tributárias. O acordo foi homologado pela Justiça e os valores devidos foram parcelados e estão sendo pagos. Fernando Capez disse ainda que, em relação à operação desta terça, ainda está se inteirando dos motivos que levaram a Justiça a decretar a prisão de seu cliente.
O auditor Artur Gomes da Silva Neto trabalhava na fiscalização direta de tributos.
Outro preso é o diretor estatutário do grupo Fast Shop Mario Otávio Gomes, que foi encontrado em um apartamento na Zona Norte de São Paulo. Procurada, a Fast Shop informou “que ainda não teve acesso ao conteúdo da investigação, e está colaborando com o fornecimento de informações às autoridades competentes”.
Além dos mandados de prisão, os agentes cumpriram 19 mandados de busca e apreensão em endereços residenciais dos alvos, nas sedes das empresas investigadas (Ultrafarma, Fast Shop e Smart Tax Consultoria) e também em outros locais ligados a executivos, funcionários, auditores fiscais e ex-funcionários da Receita Estadual.
Alvos de busca e apreensão
- Kimio Mizukami da Silva – proprietária da Smart Tax: envolvimento no esquema de corrupção e pagamento de propinas para favorecer empresas em ressarcimento de ICMS.
- Agnaldo de Campos – contador da Smart Tax: participação no esquema de propinas relacionado à manipulação fiscal e contábil;
- Ellen Franciane Pereira da Silva – funcionária da área fiscal da Fast Shop: auxílio na manipulação de processos fiscais para facilitar o esquema de corrupção;
- Felipe Signorelli Reis – funcionário da área fiscal da Fast Shop: auxílio na manipulação de processos fiscais para facilitar o esquema de corrupção;
- Caroline Camargo Godoy – funcionária área fiscal da Fast Shop: auxílio na manipulação de processos fiscais para facilitar o esquema de corrupção;
- Rogério Barbosa Caraça – diretor fiscal e contábil da Ultrafarma: participação no esquema de favorecimento e pagamento de propinas a fiscais;
- Fátima Regina Rizzardi – auxiliar do auditor Artur Gomes: assistência no esquema de corrupção envolvendo auditor fiscal;
- Maria Hermínia de Jesus Santa Clara – auxiliar do auditor Artur Gomes: assistência no esquema de corrupção envolvendo auditor fiscal;
- Marcelo de Almeida Gouveia – auditor fiscal de rendas: participação direta na corrupção, uso do cargo para prática de crimes contra a administração pública;
- Alberto Toshio Murakami – ex-agente fiscal de rendas; envolvimento no esquema de corrupção e favorecimento irregular.
De acordo com o MP, outras grandes empresas do setor varejistas podem ter se valido do mesmo esquema para conseguir a liberação dos créditos tributários. No entanto, não foi divulgado o nome de mais nenhuma outra empresa porque as investigações ainda estão em curso.
“O desafio é verificar se há outros auditores envolvidos na prática de corrupção”, disse o promotor Roberto Bodini.
A Justiça determinou também o afastamento imediato dos auditores Artur Gomes da Silva Neto e Marcelo de Almeida Gouveia das funções públicas, devido à suspeita de uso do cargo para prática de crimes contra a administração pública.
Acusações contra as empresas
De acordo com a investigação conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão aos Delitos Econômicos (Gedec), o auditor preso manipulava processos administrativos para facilitar a quitação de créditos tributários às empresas.
Segundo o MP, a Ultrafarma é a peça central no esquema de pagamento de propinas para obter favorecimento fiscal. Em contrapartida, o auditor fiscal recebia pagamentos mensais de propina por meio de uma empresa registrada em nome de sua mãe.
Já a Fast Shop teria participação no esquema de corrupção para favorecer empresas em ressarcimento fiscal, segundo o MP.
Segundo o MP, o auditor preso prestava “assessoria tributária” criminosa, indicando os documentos que deveriam ser apresentados à secretaria para acelerar o deferimento dos créditos de ressarcimento de ICMS da gigante do varejo eletrônico.
“As empresas passaram a pagar centenas de milhões de reais para auditores para auxiliarem essas empresas a conseguirem ressarcimento de crédito de ICMS a que tinham direito na Secretaria da Fazenda”, explicou o promotor João Ricupero.
“Em relação à Ultrafarma, ele tinha, inclusive, o certificado digital da empresa para fazer os pedidos de ressarcimento”, disse Ricupero.
O promotor Igor Volpato Bedone ressalva: “Ele pedia e deferia o pedido que ele mesmo fazia. Ele ficava com o certificado da empresa. Então, era um ciclo completo”, disse.
Os investigados poderão responder pelos crimes de corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
O que foi apreendido
O auditor fiscal Artur, segundo o MP, tinha um parceiro, responsável por lavar o dinheiro, que também é alvo da investigação. Na residência dele, em Alphaville, foram encontrados dois pacotes de esmeraldas, R$ 330 mil e US$ 10 mil (cerca de R$ 54.200,00) além de 600 euros dentro de um cofre.
Na casa do outro auditor, que foi alvo de um mandado de buscas e apreensão, foram apreendidos valores em espécie e uma máquina de contar dinheiro. A quantia não foi divulgada.
Nas casas de alguns investigados foram apreendidos dinheiro em espécie (incluindo R$ 330 mil, dólares e euros), pacotes de esmeraldas, joias, além de celulares, computadores e documentos digitais que serão periciados.
O MP-SP informou que os investigados poderão responder pelos crimes de corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro.

Sidney Oliveira, dono da rede Ultrafarma, foi preso em operação do MP – Foto: Ultrafarma/Divulgação
fonte: g1