Taco de beisebol, arma na cabeça e espancamento: veja como agiam advogada, PMs e empresários em esquema de tortura e agiotagem

Grupo emprestava dinheiro a juros altos e fazia cobranças mediante ameaças e agressões. Defesas dos suspeitos alegam inocência e uso indevido de dados sigilosos e imagens.
O grupo suspeito de estar à frente de um esquema de agiotagem,extorsão e lavagem de dinheiro em Luziânia, no Entorno do Distrito Federal, adotava diversos métodos de ameaças e torturas. Imagens obtidas pela TV Anhanguera mostram que os integrantes da organização criminosa chegaram a usar taco de beisebol e arma apontada para a cabeça das vítimas, além de sessões de espancamento.
De acordo com a Polícia Civil, integravam o grupo o sargento da PM Sargento Herbert Francisco Póvoa, conhecido como Mike Póvoa; a esposa dele, a advogada Tatiane Meireles; o sargento Miguel Roberto Mendonça, o policial José Ronan Ferreira Lustosa; e empresários, que seriam os responsáveis pelo financiamento do esquema.
Para a reportagem, o advogado Reginaldo Paixão, que defende Miguel Roberto, afirmou que ele é inocente e que irá entrar com um pedido de habeas corpus. A defesa de Tatiane informou que dados sigilosos, imagens, conversas e informações pessoais da cliente foram indevidamente divulgados ao público.
Já a advogada Luciana Ros, que defende José Ronan, disse que está analisando as provas e que, por se tratar de processo sigiloso, não é possível fornecer detalhes específicos sobre o caso.
Leia as íntegras das notas das defesas ao final da reportagem. A reportagem não conseguiu o contato da defesa dos outros suspeitos até a última atualização desta reportagem.
De acordo com a Polícia Civil, em uma das imagens, é a advogada Tatiane que aparece espancando um homem, em um terreno baldio, com um taco de beisebol. O objeto é o mesmo que aparece em vídeos publicados nas redes sociais do marido dela, o sargento Póvoa.
Além do objeto, o casal gostava de ostentar o uso de armas na internet. Em outro vídeo, o sargento aparece apontando duas armas para um colombiano, exigindo que ele peça perdão.
‘Fase muito boa’
Em conversas por aplicativos de mensagens, obtidas pela polícia e divulgadas pela TV Anhanguera, o sargento Póvoa comemora o sucesso financeiro que vinha alcançando com o esquema de agiotagem. Em uma das conversas, ele fala, para outro policial, que estava vivendo uma “fase muito boa” da vida.
“Estou em uma fase da vida muito boa. Só tenho a agradecer. Agiotagem tá comendo solta. Fiz um capital de giro muito bom”, disse.
Em outra conversa, o sargento alerta um colega de farda sobre como agir para não ser pego. “Sabemos que não é uma atividade legal. Então, tem que ser sábio!”, afirmou.
Operação “Mão de Ferro”
O esquema foi revelado por meio da Operação “Mão de Ferro”, realizada na última sexta-feira (28) pela Polícia Civil. A ação mobilizou cerca de 80 policiais civis para o cumprimento de mais de 10 mandados de busca e apreensão e nove mandados de prisão.
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Casal gostava de ostentar armas na internet; à dir., o sargento Póvoa aparece ameaçando um colombiano — Foto: Reprodução/ TV Anhanguera
Segundo a polícia, foram alvos da operação o líder da quadrilha, bem como financiadores e executores das cobranças violentas. Além disso, a corporação informou que a advogada atuava na “blindagem jurídica” do grupo e participava das cobranças contra as vítimas.
Os investigados devem responder pelos crimes de organização criminosa, usura (agiotagem), extorsão, lavagem de dinheiro, entre outros.
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Casal de sargento e advogada foi alvo de operação da Polícia Civil, em Goiás — Foto: Reprodução/Instagram de Mike Póvoa e Tatiane Meireles
Nota da defesa da advogada Tatiane Meireles
“A defesa da Dra. Tatiane Meireles vem a público reafirmar seu compromisso com a Constituição Federal, o devido processo legal e o respeito às decisões judiciais proferidas no curso da investigação criminal em andamento.
Embora informações estejam sendo veiculadas de forma ampla pela imprensa, cumpre esclarecer que o Juízo da 2ª Vara das Garantias da Comarca de Goiânia determinou expressamente o sigilo absoluto sobre todas as diligências e provas colhidas, bem como a manutenção da anonimização da identidade dos investigados, a fim de garantir a lisura e a imparcialidade da apuração.
O modelo de Juiz de Garantias, previsto no artigo 3º-B do Código de Processo Penal, tem como função precípua resguardar os direitos fundamentais do investigado na fase pré-processual, assegurando que eventuais medidas cautelares, como prisões e buscas, sejam apreciadas de forma imparcial, técnica e apartada da fase acusatória.
As determinações emanadas do Juízo das Garantias não representam recomendações discricionárias, mas ordens judiciais vinculantes, cuja observância é imperativa por todos os órgãos responsáveis pela persecução penal. O seu descumprimento, especialmente em sede de medidas sigilosas, compromete não apenas a validade da prova, mas também a integridade do sistema de justiça.
Ao contrário do que foi determinado judicialmente, dados sigilosos, imagens, conversas e informações pessoais da Dra. Tatiane Meireles foram indevidamente divulgados ao público, em frontal descumprimento à ordem judicial, o que pode configurar grave violação ao ordenamento jurídico vigente, além de comprometer o direito à ampla defesa e à presunção de inocência.
A defesa técnica informa que não contribuirá para que a lisura do processo seja comprometida por juízos precipitados, pressões externas ou contaminações indevidas do ambiente processual. Atuaremos com firmeza, responsabilidade e respeito ao rito legal, reiterando total confiança na Justiça e na preservação das garantias constitucionais.
Cientes de que as investigações ainda estão em curso e não se trata de ação penal em andamento, reiteramos que todas as imputações serão devidamente enfrentadas no foro adequado, com base em provas lícitas, respeitando-se o contraditório e a ampla defesa.”
Nota da defesa do sargento Miguel Roberto Mendonça
“A defesa do Sgt. Miguel Roberto Mendonça, informa com indignação sobre a homologação da prisão preventiva, concretizada em audiência de custódia, realizada no último sábado, dia 29 de novembro de 2025.
Imperioso esclarecer que o Sgt. Miguel nega veementemente qualquer participação nos crimes em que está sendo investigado, indicando desde logo, o total interesse em auxiliar para que a verdade real dos fatos seja o quanto antes solidificada.
Em tempo, cabe indicar que ao longo da persecução penal, serão apresentados todos os elementos que demonstram a inexistência de sua suposta participação nos ilícitos em comento, bem como por agora, aduz a total inexistência dos requisitos autorizadores da medida extrema (prisão cautelar), razão pela qual, a prisão preventiva se revela desnecessária e desproporcional no caso concreto.
Por fim, a defesa confia que, com a análise técnica dos fatos e das provas, serão restabelecidos os direitos e garantias constitucionais do Sgt. Miguel Roberto Mendonça.”
Nota da defesa do PM José Ronan
“A defesa de José Ronan, a pedido da imprensa, vem se manifestar a respeito do processo que tramita em segredo de justiça.
Informamos que estamos analisando detidamente todas as provas constantes nos autos. Contudo, por se tratar de processo sigiloso, não é possível fornecer detalhes específicos sobre o caso.
Ressaltamos que serão rigorosamente observados o contraditório e a ampla defesa, com a adoção de todas as medidas jurídicas cabíveis para comprovar a inocência de nosso constituinte”.
Nota da Polícia Militar do Estado de Goiás
“A Polícia Militar do Estado de Goiás informa que, a partir do compartilhamento de informações entre as forças de segurança, a Polícia Civil deflagrou operação na cidade de Luziânia, resultando na expedição de mandados de prisão contra três militares e outros suspeitos, investigados pelos crimes de extorsão, agiotagem e demais delitos correlatos.
A Corporação não compactua com desvios de conduta e reitera seu compromisso com a ética, a legalidade e a transparência. As medidas administrativas cabíveis já foram adotadas e seguirão em estrita observância às normas internas.
A Polícia Militar do Estado de Goiás permanece colaborando integralmente com as investigações, a fim de esclarecer todos os fatos no âmbito judicial.”
Nota da OAB-Goiás
“A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO), por meio da Subseção de Luziânia, repudia, com veemência, o suposto envolvimento de uma advogada em um caso de agressão ocorrido no município.
A conduta relatada é absolutamente incompatível com a ética, a dignidade e os princípios que regem a advocacia, especialmente o compromisso da profissão com a legalidade, o respeito aos direitos fundamentais e a preservação da integridade física e moral de qualquer pessoa.
Diante da gravidade da situação, a Subseção determinou o afastamento preventivo da profissional de suas funções institucionais.
Paralelamente, a Seccional informa que instaurará procedimento ético-disciplinar no âmbito do Tribunal de Ética e Disciplina, a fim de apurar os fatos com rigor, assegurando o contraditório e a ampla defesa, como determina o devido processo legal.
A OAB-GO deixa claro que não compactua com quaisquer práticas de violência, abuso ou desvio de finalidade no exercício da advocacia e seguirá atuando com firmeza para preservar o prestígio, o respeito e a responsabilidade social da advocacia goiana.”
Fonte: g1 Goiás




