Seca extrema no Amazonas, cidades correm risco de desabastecimento
A estiagem histórica tem assolado o Amazonas e causado transtornos para a população local, que utiliza os rios como principal meio de transporte e para distribuição de alimentos.
O governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), anunciou, nessa sexta-feira (29/9), um decreto de situação de emergência no estado. Dos 62 municípios amazonenses, apenas dois não sentem os efeitos da seca extrema.
O decreto do governo do estado antecipa o reconhecimento do estado de emergência a municípios que ainda não o declararam com objetivo de agilizar a ajuda às cidades que têm previsão de piora no quadro de seca.
Segundo a Defesa Civil do Amazonas, atualmente, 20 municípios estão em situação de emergência e 35, em alerta.
Entre as novas medidas, estão:
- a dispensa de licitação de contratos de aquisição de bens necessários para os desastres, incluindo a compra inicial de 50 mil cestas básicas;
- a flexibilização da licença para abertura de novos poços artesianos em áreas afetadas e o amparo a produtores rurais por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
- também será suspensa a cobrança do valor de R$ 1 nos restaurantes do programa Prato Cheio, coordenado pela Secretaria de Estado da Assistência Social (Seas), em municípios em situação de emergência.
Manaus, capital do estado, e outros 18 municípios decretaram situação de emergência. As cidades mais críticas são: Benjamin Constant, São Paulo de Olivença, Envira, Itamarati, Jutaí, Fonte Boa, Japurá e Maraã.
A confeiteira Laila Ramos, 35 anos, moradora de Jutaí, contou que só consegue cozinhar e fazer as encomendas à noite, uma vez que não há água na cidade durante o dia.
“A água só vem à noite e bem fraquinha. A gente precisa limpar, lavar as coisas. Isso tem prejudicado geral”, contou. “Hoje, por exemplo, vou dormir lá pelas 2h, porque preciso produzir, tenho de deixar tudo pronto e limpar as coisas no horário que a gente tem água”, completou a confeiteira.
Segundo Laila, até o momento, a Prefeitura de Jutaí não tem apresentado soluções para a falta de água, e a população local tenta se manter do jeito que dá.
Além da falta de água, a confeiteira disse que sente os efeitos da seca também no preço dos alimentos. De acordo com ela, o tambaqui, peixe de água doce e comum na região, está mais caro. “O tambaqui é um peixe maior, comprei por R$ 150 e, antes, custava uns R$ 80. Aumentou bastante [o preço]”, lamentou.
O empresário Raimundo Coelho, 37, tem sentido uma baixa no número de hóspedes no hotel dele, localizado às margens no Rio Amazonas, também em Jutaí.
“Os clientes que ficam no meu hotel vêm de barco e, como está muito seco, alguns barcos não têm vindo até aqui”, contou Raimundo. O empresário estima que houve uma queda de, aproximadamente, 30% no negócio devido à estiagem.
Raimundo acrescentou que a seca deste ano está mais severa do que em épocas anteriores. “O calor aumentou. Tá muito quente, não chove, tá só seca mesmo.”
O músico Valdemir Avelino, mais conhecido como Maraza, 49, destaca que a seca tem afetado o cotidiano de várias formas, principalmente no trabalho e na compra de alimentos. O artista mora em Benjamin Constant (AM) e reclama do preço dos alimentos.
“Tudo o que as pessoas consomem vem da capital. Então, para chegar até aqui, é mais complicado ainda, porque o município fica na entrada de um rio que é um braço do Solimões [Rio Amazonas], e os barcos não têm vindo mais para cá”, ressaltou o músico.
“Frango, arroz, óleo, essas coisas básicas aumentaram muito o preço, e a população fica à mercê dessa situação. A renda do consumidor não aumentou, e o cabra tem de fazer malabarismo para equilibrar as contas do mês”, relatou Maraza.
Além do aumento dos preços dos alimentos, o músico falou que está cada vez mais difícil fazer shows, uma vez que ele utiliza o rio como meio de transporte.
“Justamente por essa seca está muito complicado. O transporte que a gente usava para fazer os shows custava R$ 35. Agora secou, e, para a gente, está custando R$ 75, só para ir, para voltar, são mais R$ 75”, disse Maraza.
O prefeito de Benjamin Constant, David Bemerguy (MDB), alerta para o risco de desabastecimento da cidade, mas salienta que tem pedido apoio dos governos estadual e federal para tentar atender a população local.
“Se continuar secando mais ainda, a cidade pode passar por um momento muito crítico, de colapso, e risco de desabastecimento total. No momento, estamos apenas com uma redução de produtos”, informou o prefeito de Benjamin Constant.
David contou que mobilizou o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) com o intuito de fazer uma “dragagem”, retirada de sedimentos do fundo dos rios. “Seria uma forma de amenizar e evitar o risco de isolamento total de barcos e navios para trazer alimentos e produtos para a região”.
Ele destacou que o Dnit faz ações na região e espera que, até o fim de semana, consiga amenizar a situação da cidade.
Ações do governo
O governador Wilson Lima anunciou a compra inicial, sem licitação, de 50 mil cestas básicas, além de kits de alimentos para distribuir aos alunos em situação de vulnerabilidade alimentar.
Wilson Lima esteve em Brasília nesta semana e se encontrou com os ministros da Integração e do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes (PDT), e do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), a fim de discutir ações da força-tarefa para atender a população local.
Waldez Góes informou que vai atuar, principalmente, na ajuda humanitária, como na distribuição de alimentos, água, kits de higiene e itens de saúde. A ajuda deve chegar aos municípios amazonenses por meio da Força Aérea Brasileira (FAB) e da Marinha.